
Na postagem anterior falamos do uso de insetos de algumas espécies como fonte de proteína para alimentação humana. Essa é uma ideia que causa asco em muita gente, mas que poderá significar o barateamento desses alimentos para populações pobres de todo o mundo.
De acordo com os especialistas algumas espécies de insetos podem fornecer quantidades adequadas de proteínas e vitaminas a um custo bem inferior que as tradicionais carnes utilizadas na alimentação humana como a de bovinos, suínos e aves. Além disso, o impacto ambiental dessa produção seria bem menor.
Aqui no Brasil (felizmente), ainda temos muitas opções antes que seja necessário chegar a esse ponto. Além da grande disponibilidade de áreas agricultáveis para a produção de grãos destinados a fabricação de rações para a engorda de animais criados em cativeiro, ainda dispomos de boas pastagens para a criação extensivas de bovinos. Ou seja, ainda estamos bem longe dos hambúrgueres de farinha de grilo que citamos na postagem anterior.
Uma das proteínas animais cuja produção vem ganhando relevância cada vez maior aqui em nosso país é a dos peixes. De acordo com dados divulgados recentemente pela PeixeBR – Associação Brasileira da Piscicultura, e referentes ao período 2020/2021, a produção nacional cresceu 5,93%. Foram 802.930 toneladas, com destaque para as tilápias.
Segundo dados da EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias, a produção brasileira foi de 257 mil toneladas em 2005, o que demonstra um crescimento superior a 200% em cerca de 15 anos. E o melhor – o país tem condições de aumentar ainda mais essa produção em muito pouco tempo.
Desde 2020, o Governo Federal vem desburocratizando as concessões de licenças para a criação de peixes em cativeiros nos reservatórios de grandes usinas hidrelétricas do país. Essa lista inclui 73 reservatórios, onde cerca de 60 poderiam ser usados para a criação de espécies exóticas como as tilápias. Outros 13 reservatórios – sendo 6 na Amazônia, seriam restritos a criação de espécies nativas.
Um outro projeto que segue em discussão é o uso do reservatório da Usina Hidrelétrica de Itaipu para piscicultura em cativeiro. Essa proposta depende da autorização do Congresso do Paraguai, país que tem a soberania sobre metade das águas do reservatório. De acordo com projeções já divulgadas, o uso do Lago de Itaipu sozinho tem potencial para aumentar a produção nacional de peixes em 40%.
Apesar dos bons e animadores números, essa é uma questão que requer uma série de cuidados ambientais, a começar pelos riscos de fuga de peixes exóticos para águas de rios brasileiros. Conforme já tratamos em inúmeras postagens aqui do blog, a introdução de espécies animais em vegetais em novos ambientes cria uma série de problemas.
O caso mais recente, que apresentamos há poucos dias atrás, é o dos estorninhos, uma ave de origem euroasiática que começou a invadir o Brasil através do Rio Grande do Sul. Esses pássaros passaram a ser importados e vendidos como animais de estimação na Argentina na década de 1980. Muitos espécimes fugiram dos seus cativeiros e/ou foram soltos, passando a colonizar novos territórios rapidamente.
Um caso mais dramático e bem mais convergente com o atual é o das carpas asiáticas que invadiram as bacias hidrográficas dos rios Mississipi, Missouri e Ohio, nos Estados Unidos. Essa espécie, largamente utilizada em criações comerciais, foi introduzida no país por piscicultores do Sul americano na década de 1970, e, em uma das inúmeras enchentes do rio Mississipi, os peixes escaparam e passaram a colonizar o leiro do rio.
Sem encontrar predadores naturais, dispondo de grandes estoques de alimentos e possuindo uma alta taxa de natalidade – cada fêmea da espécie possui em seu ventre cerca de 1 milhão de ovas, as carpas encontraram um meio ambiente ideal e suas populações passaram a aumentar descontroladamente. Segundo as autoridades norte-americanas, a espécie passou a avançar 80 km a cada ano dentro das bacias hidrográficas, ameaçando as espécies locais.
Já existem inúmeros casos de espécies exóticas de peixes que foram introduzidas em rios aqui do Brasil e precisamos ficar em alerta para que outras introduções, mais dramáticas, venham a ocorrer. Imaginem a possibilidade de algum piscicultor resolver criar percas-do-Nilo em águas de um desses reservatórios.
A perca-do-Nilo é um predador de topo na cadeia alimentar, que pode superar os 250 kg de peso e atingir um comprimento de até 2 metros. Como o nome indica, o peixe é originário da bacia hidrográfica do rio Nilo. Em meados da década de 1950, sabe-se lá como, a espécie foi introduzida no Lago Vitória com o objetivo de aumentar a produção pesqueira, o que acabou se transformando em um verdadeiro desastre ambiental. Veja detalhes nesse link.
A ideia de aumentarmos e produção de pescados aqui no Brasil e, assim, permitirmos um acesso cada vez maior de populações mais pobres a uma proteína de ótima qualidade e baixo custo é tentadora. Porém, todos os cuidados ambientais devem ser considerados.
Nossos rios já sofrem com problemas criados pela poluição, pelos desmatamentos, pela mineração (legal e ilegal), entre muitos outros. Estimularmos a produção de peixes em cativeiro sem maiores cuidados ambientais poderá aumentar, e muito, os problemas já existentes.
Convém que redobremos a nossa atenção a fim de acompanharmos os processos de implantação desse tipo de empreendimento em reservatórios brasileiros. Vai que algum maluco resolva criar piranhas ou algum outro tipo de “peixe brabo” num desses lagos…
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