
No meu último post falei sobre o problema gerado pelo lançamento de águas pluviais na rede coletora de esgotos e sobre os transtornos provocados pelo volume de efluentes muito acima da capacidade de vazão desta rede. Vamos apresentar o outro lado desse problema: o lançamento de esgotos nas tubulações da rede de águas pluviais.
Períodos bem definidos de chuvas são uma das características de países de clima equatorial e tropical como o do Brasil. Por mais precária que seja a infraestrutura de qualquer cidade, sempre existirá uma preocupação mínima com a drenagens das águas da chuva – o corte dos terrenos para a abertura de ruas e avenidas; o piso das calçadas acima do nível das ruas; a construção de guias, sarjetas e bocas de lobo; a instalação de tubulações de grande porte nos pontos mais baixos: todas essas providências visam criar caminhos para o escoamento das enxurradas fortes dos dias de chuva.
Esse sistema de drenagem, mais ou menos sofisticado de acordo com a capacidade das cidades, utiliza a força da gravidade para fazer a água fluir de um ponto mais alto para um ponto mais baixo do terreno, que normalmente é o vale de um rio ou um córrego. Os sistemas de esgotos sanitários funcionam utilizando esse mesmo sistema: o esgoto corre sempre de um ponto mais alto para um ponto mais baixo do terreno também usando a força da gravidade. E é justamente aí que reside o problema – se o sistema funciona para a água da chuva também funcionará para fazer o esgoto correr.
Os sistemas e as redes de drenagem das águas pluviais, na falta de redes coletoras de esgotos, acabam sendo utilizados pelas populações para a drenagem dos efluentes de suas casas. Essa prática, largamente difundida em bairros periféricos das grandes e médias cidades de nosso país (nos lugarejos mais pobres o esgoto corre a céu aberto aleatoriamente pois não existe uma rede de drenagem de águas pluviais), criam inúmeros problemas de saúde para as populações, contaminam o meio ambiente e rebaixam a qualidade de vida de todas as áreas adjacentes. Porém existe um outro grave problema, que nem sempre pode ser visto pelas populações: a composição química dos esgotos pode, literalmente, dissolver o concreto das tubulações de águas pluviais.
Os esgotos que saem de sua casa são uma verdadeira sopa de produtos químicos: a urina humana, por exemplo, possui mais de 3.000 componentes; some-se a isto as fezes, os produtos químicos usados na limpeza; conservantes, aromatizantes, corantes e outros químicos usados em alimentos; substâncias químicas usadas na fabricação de remédios e que são eliminadas pela urina e pelas fezes e por aí vai – grande parte dos elementos da Tabela Periódica são encontrados nos esgotos.
Para citar um único problema, a decomposição dos esgotos por bactérias nas tubulações gera o gás sulfídrico (H2S), que tem como característica um odor que lembra “ovo podre”. Em altas concentrações nas tubulações, esse gás venenoso pode ser fatal para os trabalhadores que fazem a manutenção das redes subterrâneas de esgotos e de águas pluviais. Esse gás também é altamente corrosivo para o concreto que, em contato com o gás, vai enfraquecendo (o concreto literalmente vai se transformando em gesso). Não são raras as vezes em que trechos de ruas afundam de uma hora para outra – as tubulações de concreto da rede de drenagem pluvial enfraquecem tanto por causa da corrosão por gás sulfídrico que não suportam mais o peso dos carros que circulam pelas ruas e entram em colapso. Os prejuízos são enormes – toda a tubulação tem de ser trocada e o calçamento da rua refeito.
Por fim, o maior de todos os problemas – os esgotos serão canalizados diretamente para rios e córregos, sem passar por qualquer tipo de tratamento, causando a morte de peixes e comprometendo as fontes de abastecimento de água que estão na base do saneamento básico. Um prejuízo completo!
