OS PROBLEMAS NO BAIXO RIO SÃO FRANCISCO

Penedo

Consta nos livros de história que a descoberta da foz do Rio São Francisco se deu no dia 4 de outubro do ano de 1501, quando uma expedição exploratória comandada pelo navegador Américo Vespúcio fazia o primeiro mapeamento da costa brasileira. O rio foi batizado em homenagem a São Francisco de Assis, santo homenageado nesta data pelo calendário da Igreja Católica. Segundo o relato desses primeiros exploradores, a força da correnteza do Rio era tão intensa que suas águas doces avançavam até 4 quilômetros mar adentro. Esse fato também é relatado por antigos capitães de navios mercantes que entravam pelo canal do Rio São Francisco em direção da cidade de Penedo (vide foto), no Estado de Alagoas.

A primeira vez que visitei Penedo foi em 1990 – estava passando alguns dias de folga em Maceió e ouvi a recomendação de diversos moradores locais para visitar esta antiga cidade colonial, definida por muitos como a Ouro Preto do Nordeste. Eu nunca havia ouvido falar de Penedo e, curioso, acabei acatando a recomendação. Para minha grata surpresa, descobri que a cidade ficava às margens do lendário São Francisco – o encantamento foi duplo: pela cidade e pelo Rio. Com o passar dos anos, a minha alegria por ter feito essa viagem naquela época só aumentou – menos de quatro anos depois dessa primeira visita ao Rio São Francisco, a Usina Hidrelétrica de Xingó foi inaugurada e, com a redução da vazão do Rio, teve início a acentuada deterioração das condições ambientais na sua foz, que tive o “desprazer” de conferir in loco em uma nova visita no ano de 2007. Vamos entender um pouco disto:

Na época do descobrimento da foz do Velho Chico, conforme comentado em diversas postagens, a Mata Atlântica cobria a faixa litorânea do Brasil, desde o Rio Grande do Sul até o Rio Grande do Norte. No trecho do Nordeste, a Mata tinha uma largura média de  30 km entre o litoral e o Agreste – em alguns trechos, como no caso da região da foz do Rio São Francisco, essa largura podia chegar aos 80 km; como o processo de destruição da floresta começou junto com a colonização da terra e na época não foram feitos estudos sobre os recursos naturais do país, nunca teremos certeza da sua real extensão. O que é certo: em menos de 200 anos, a floresta sucumbiu aos canaviais.

Com a destruição da Mata Atlântica e, especialmente, de extensos trechos das matas ciliares, o assoreamento e o entulhamento de riachos e ribeirões na região do baixo São Francisco se transformou em uma espécie de “parte da paisagem” – muitos pequenos afluentes do Rio São Francisco, que formavam uma extensa rede hidrológica regional, desapareceram ao longo dos séculos. Os volumosos caudais do rio vindos desde os mais distantes sertões sempre mascararam estes problemas, garantindo a presença de água para o abastecimento, navegação e agropecuária – o eventual desaparecimento de uma fonte de água podia ser compensado com a migração da população e das culturas para um outro local São Francisco acima, onde podia se encontrar um outro afluente ainda intacto; a formação de pequenos bancos de areia em trechos do rio principal ou a redução das contribuições destes pequenos rios passava despercebida pela população.

Em décadas mais recentes, após a construção de grandes barragens como a de Sobradinho e a de Xingó, estes problemas aumentaram de forma exponencial, mostrando toda a fragilidade ambiental da região. A redução sistemática do volume de caudais na direção da foz minou as forças do Velho Chico, deixando-o cada vez mais vulnerável ao avanço das águas do mar terras a dentro. Hoje, a salinização das águas do Rio São Francisco é um dos maiores problemas regionais, afetando desde a pesca até a saúde das populações, cada vez mais exposta ao consumo de água com altos níveis de sal – em algumas cidades e vilarejos está acontecendo uma verdadeira epidemia de moradores com hipertensão arterial. Para ter acesso a água potável, moradores das margens do baixo Rio São Francisco precisam, muitas vezes, viajar vários quilômetros em busca de nascentes ou de cacimbas onde a água ainda não está contaminada com altos níveis de sal.

Vamos detalhar isso nas próximas postagens.

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