
Na nossa última postagem falamos de um estudo da AGU – União Americana de Geofísica, na sigla em inglês, publicado na última edição do periódico Geophysical Research Letters, que demonstrou que a retirada de grandes volumes de água de reservas subterrâneas está alterando o eixo de rotação de nosso planeta.
Como é de praxe aqui no blog, gostamos de apresentar as informações com profundidade. Por isso, vamos falar um pouco sobre essas reservas subterrâneas de água, dos seus usos e, principalmente, dos seus inúmeros problemas.
É comum que pessoas leigas imaginem que o subsolo possui extensas cavernas e que esses locais armazenam grandes quantidades de água. Na verdade, até existem algumas cavernas com essas características, mas elas são a exceção à regra.
Na realidade, os grandes depósitos subterrâneos de água são formados por camadas de rochas altamente porosas como os arenitos, que armazenam grandes quantidades de água. Um bloco de arenito com volume de 1 metro cúbico pode armazenar até 600 litros de água.
Um exemplo bastante didático de como isso funciona é pegar um cubo de açúcar e encostá-lo no café de uma xícara. Rapidamente será possível ver o açúcar mudando de cor devido a absorção do café. Outra forma de imaginar essa absorção de água é imaginar o arenito como uma grande esponja de lavar louça.
Esses depósitos subterrâneos de água podem ocupar áreas que vão do tamanho de um lote residencial até enormes extensões como a ocupada pelo Aquífero Guarani, um dos maiores reservatórios subterrâneos de água do mundo. Esse aquífero ocupa uma área de 1,2 milhão de km² dentro no Brasil, Paraguai, Argentina e Uruguai.
Em muitas regiões áridas e semiáridas do mundo, a extração da água desses reservatórios é, literalmente, “a salvação da lavoura”. Essa água garante o abastecimento das populações humanas, a dessedentação dos animais e a prática da agricultura.
O uso desenfreado dessas águas, que é o que está acontecendo em vários lugares do mundo, causa uma série de problemas. Para começar, o tempo de recarga de algumas dessas reservas subterrâneas pode levar alguns milhares de ano.
Deixem-me citar o caso do Aquífero Guarani, que começou a se formar há cerca de 130 milhões de anos durante o Derrame de Trapp. Dezenas de vulcões entraram em erupção simultaneamente e derramaram enormes volumes de lava vulcânica sobre as areias de um antigo deserto que existia na região onde encontramos atualmente a bacia hidrográfica do rio Paraná.
As areias desse deserto foram comprimidas por grandes massas de rochas vulcânicas, principalmente granitos e basaltos, se transformando em arenito com o passar do tempo. A água foi infiltrando lentamente através da camada de rochas superficiais – o aquífero levou dezenas de milhares de anos para ser carregado.
Todo esse enorme patrimônio natural pode ser destruído em poucas décadas pela exploração de grandes volumes de água – a velocidade com que a água é consumida é milhares de vezes mais rápida que a velocidade da recarga do aquífero. Esse é um problema comum em muitos aquíferos do mundo.
Outro problema sério diz respeito às nascentes formadoras de córregos, riachos e rios – essas fontes são alimentadas pela água armazenada em aquíferos e outros depósitos subterrâneos de águas.
Estudos indicam que entre 15% e 21% das bacias hidrográficas do mundo já sofreram redução nos seus volumes de água devido a retirada excessiva de água das reservas subterrâneas. Até o ano de 2050, algo entre 40% e 79% das bacias hidrográficas poderão estar impactadas por essa prática.
Por fim e não menos importante, a perfuração excessiva de poços pode permitir que contaminantes – esgotos, derivados de petróleo, chorume resultante da decomposição de lixo e outros resíduos, resíduos da mineração, entre outras fontes, possam se infiltrar através desses poços e contaminar as águas subterrâneas.
De uma forma bastante resumida, essas são algumas das principais ameaças às reservas subterrâneas de água do nosso mundo. E é mais uma questão grave para nos preocuparmos.
