RIOS DOS ESTADOS UNIDOS ESTÃO SENDO INVADIDOS PELO PEIXE CABEÇA-DE-COBRA ASIÁTICO 

Em nossa última postagem falamos da caótica introdução do pirarucu, uma espécie de peixe típica da Bacia Amazônica, em rios de Estados como São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Um peixe carnívoro e de grande porte como o pirarucu poderá destruir inúmeras espécies nativas desses rios. 

Lamentavelmente, esse não é um problema exclusivo de rios brasileiros. Por todos os recantos do mundo existem casos da introdução – acidental ou proposital, de espécies exóticas, com graves prejuízos para o meio ambiente aquático. 

Um caso que está chamando a atenção nos meios de comunicação é o do peixe cabeça-de-cobra, uma espécie originária da Ásia e que está invadindo diversos rios nos Estados Unidos. O primeiro caso registrado em um rio norte-americano foi em 2002. Desde então, o peixe vem se espalhando por diversos Estados, como Virginia, Maryland, Pennsylvania, Nova York e, particularmente no Missouri.   

Conhecido popularmente como “northern snakehead”, o peixe pertence ao gênero Channa, com 50 espécies diferentes descritas pela ciência. A distribuição geográfica das espécies se estende do Iraque ao extremo Leste da China, em partes da Sibéria, Noroeste da Índia e Sudeste Asiático. Em seu ambiente natural, o peixe não causa nenhum problema e sua carne é bastante apreciada pelas populações.

O peixe cabeça-de-cobra pode chegar a um comprimento de até um metro, sendo bastante apreciado por aquaristas. Aliás, a principal hipótese das autoridades ambientais norte-americanas é que a invasão dos rios pelos peixes se deveu ao descarte acidental ou proposital por aquaristas. 

Uma característica interessante do peixe cabeça-de-cobra é a presença de um órgão labirinto que permite ao animal respirar ar por alguns minutos. Isto permite que o peixe “ande” por terra em busca de poças ou corpos de água com melhores condições ambientais. 

Carnívoro voraz como os nossos pirarucus, o peixe cabeça-de-cobra se alimenta de peixes menores, anfíbios, vermes, crustáceos, répteis e até pequenos roedores, causando enormes impactos nas populações nativas dos rios. E muito pior – esses animais não têm predadores naturais no país, o que leva a um crescimento populacional sem controle. 

O Missouri é o Estado mais preocupado com a invasão dos peixes cabeça-de-cobra – seu território é cortado pelo grandioso rio Missouri, o maior rio dos Estados Unidos e maior afluente do rio Mississipi. Juntos, esses rios formam a maior bacia hidrográfica da América do Norte – a Mississipi-Missouri, com área de 3,2 milhões de km², onde se incluem outros grandes rios como o Ohio, Illinois, Arkansas e o Atchafalaya. A área dessa bacia hidrográfica abrange 31 Estados norte-americanos e duas províncias do Canadá. 

Além da imensa área geográfica afetada, o peixe invasor é muito parecido com o bowfin ou peixe-cabeça-de-arco, uma espécie nativa dos Estados Unidos e que pode ser confundida com o cabeça-de-cobra. Em caso de captura da espécie invasora, as autoridades ambientais pedem que os animais sejam mortos, preferencialmente com decaptação e remoção dos órgãos. Em caso de dúvida na identificação, os serviços ambientais estão disponibilizando uma série de canais de comunicação. 

A chegada dos peixes cabeça-de-cobra às águas dos rios da bacia hidrográfica Mississipi-Missouri só vem aumentar os problemas ambientais já criados pelas carpas asiáticas, uma espécie exótica que vem se espalhando pelas águas destes rios desde a década de 1990. 

A carpa comum (Cyprinus carpio) é originária de lagos e rios da Ásia, especialmente da região da Eurásia Central. A espécie, que pode atingir um comprimento de até 1,2 metro e um peso de 50 kg, sempre foi utilizada para a alimentação humana. Desde a antiguidade, as carpas foram introduzidas em rios e lagos de toda a Ásia e Europa, tornando-se uma das espécies invasoras mais difundidas em todo o mundo – calcula-se que a espécie esteja presente atualmente em mais de 80 países.   

No início da década de 1970, algumas fazendas de criação de peixes localizadas nas margens do rio Mississipi, no Sul dos Estados Unidos, passaram a importar carpas asiáticas, com o objetivo de controlar infestações de algas e moluscos nos tanques de criação dos peixes. Segundo as informações que foram repassadas aos aquacultores por especialistas em controle biológico, essas carpas eram peixes vorazes e com um apetite insaciável, podendo consumir diariamente até 40% do seu próprio peso em alimentos. 

Os problemas começaram no início da década de 1990, quando a bacia hidrográfica do rio Mississipi passou a enfrentar sucessivas cheias acima da média histórica, especialmente em regiões próximas do Delta do Mississipi. No seu trecho final, o rio Mississipi se abre num grande delta, que se estende por cerca de 400 km de largura e ocupa uma área total de 75 mil km².   

Várias dessas fazendas foram atingidas e as carpas asiáticas acabaram sendo arrastadas dos tanques na direção da calha do rio Mississipi. Extremamente fortes e adaptáveis, as carpas passaram a colonizar as águas do rio. A exceção dos jacarés-norte-americanos (Alligator mississippiensis), as carpas asiáticas não possuem predadores naturais na bacia hidrográfica e acabaram avançando vorazmente contra as espécies nativas, alterando totalmente a biodiversidade do ecossistema. 

Um país que já enfrentava os imensos problemas ambientais criados pela invasão dos seus rios pelas carpas asiáticas, agora está tendo de lutar numa segunda frente conta os peixes cabeça-de-cobra. 

E as notícias não são nada animadoras para os norte-americanos – a história mostrou que, quando um habitat é tomado por uma espécie exótica, existe muito pouco a se fazer senão tentar controlar o tamanho das populações invasoras. 

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