
Conforme apresentamos em uma postagem recente aqui do blog, gatos domésticos representam uma perigosa ameaça para a fauna silvestre – a imagem acima ilustra bem isso. Curiosamente, O Município, um periódico da cidade de Blumenau e região, publicou uma reportagem que trata de um desses casos – uma única gata que conseguiu exterminar uma espécie de ave em uma das ilhas da Nova Zelândia.
As ilhas que formam o arquipélago da Nova Zelândia estão separadas de outras áreas continentais há, pelo menos, 19 milhões de anos. Devido a esse isolamento, as únicas espécies de mamíferos nativos das ilhas são os morcegos, que chegaram voando. A fauna original local era formada essencialmente por aves, peixes e insetos. Algumas espécies de mamíferos marinhos como baleias e focas visitam as ilhas frequentemente, porém sem causar impactos ambientais.
A invasão do território neozelandês por espécies exóticas começou por volta do ano 1300, quando desembarcaram nas ilhas as primeiras expedições de maoris, grupo polinésio originário do Sudeste Asiático. Em suas grandes canoas, os maoris transportavam porcos, galinhas, cães e gatos, entre outros animais domésticos. Ao longo dos últimos 700 anos, essas espécies invasoras (incluindo na lista os humanos) passaram a competir com as espécies nativas, levando muitas delas a extinção.
Uma das primeiras espécies da fauna da Nova Zelândia a ser extinta após a chegada dos maoris às ilhas foram as moas, um grupo de aves que era formado por nove espécies de seis gêneros. Essas aves não voavam e as duas maiores espécies, a Dinornis robustus e a Dinornis novaezelandiae podiam atingir uma altura de 3,6 metros com o pescoço estendido e um peso de 230 kg. Quando os polinésios desembarcaram nas ilhas por volta do ano 1280, estima-se que existiam cerca de 58 mil moas – no ano 1440, todas as moas já haviam desaparecido devido à caça excessiva.
A situação se complicaria ainda mais nas primeiras décadas do século XIX, época em que foi iniciada a colonização das ilhas pelos britânicos. Os recém-chegados traziam, além de suas bagagens e sonhos, novos animais domésticos como vacas, cavalos, porcos, ovelhas, cabras galinhas e patos, entre outras espécies, além de seus próprios gatos e cachorros.
Após essa segunda onda de espécies animais invasoras, todo um grupo de espécies de aves terrestres passaram a desaparecer das grandes ilhas, ficando restritas a alguns poucos recantos isolados e ilhas vizinhas. Um desses casos foi o da pequena ilha de Stephen, separada de uma das grandes ilhas por um canal com cerca de 3,2 km de largura.
A aparente tranquilidade desse refúgio natural terminou em 1892, ano em que foi construído um farol marítimo na ilha. Diferente dos faróis automáticos modernos, as instalações antigas dependiam da presença de um faroleiro, que na grande maioria dos casos, vivia sozinho nesses locais.
O primeiro faroleiro alocado na ilha de Stephen não suportou a solidão e, poucos meses depois, foi substituído por David Lyall, que trouxe junto com suas bagagens Tibbles, sua gata de estimação. Como todo felino, a curiosa gata passou a fazer seus passeios pelo interior da minúscula ilha e começou a abater aves terrestres que encontrava pelo caminho.
A principal presa da gata era a cotovia-da-ilha-de-Stephen, uma pequena ave terrestre com cerca de 10 cm de altura. A espécie, que no passado era encontrada nas grandes ilhas da Nova Zelândia, tinha encontrado na ilha de Stephen o seu derradeiro refúgio.
Como é comportamento comum nos gatos domésticos, Tibbles costumava trazer algumas das cotovias que caçava para a sua casa no farol. David Lyall guardou algumas dessas aves mortas, que depois vendeu para o barão Walter Rothschild, um famoso ornitólogo da época. O cientista identificou a ave como uma espécie nova para a ciência e a batizou com o nome de Traversia lyalli. Infelizmente, a espécie já se encontrava extinta naquele momento.
Tibbles foi a responsável pela extinção da cotovia-da-ilha-de-Stephen, porém, ela não pode ser responsabilizada – gatos são animais irracionais e agem por puro instinto. A culpa é toda do humano que a levou para o ambiente da ilha – David Lyall.
Desgraçadamente, existem muitos desses Davids espalhados por nosso mundo…
