O “ESTRANHO” PROTOCOLO DE INTENÇÕES ASSINADO ENTRE O MINISTÉRIO DOS POVOS INDÍGENAS E A AMBIPAR 

No último dia 24 de janeiro, começaram a circular notícias que tratavam da assinatura de um protocolo de intenções entre o Ministério dos Povos Indígenas e a empresa Ambipar. O documento foi assinado no Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça. 

De acordo com o noticiário, esse protocolo de intenções teria como principal objetivo o enfrentamento da emergência climática nas chamadas TIs – Terras Indígenas, de todo o Brasil. É importatnte citar que o Grupo Ambipar surgiu a partir de uma empresa de gestão ambiental criada em 1995 e hoje tem negócios em mais de 40 países. O grupo brasileiro é especializado na prestação de serviços e em produtos voltados para a gestão ambiental. 

Segundo o anúncio, essa iniciativa “bem intencionada” tem alguns pilares fundamentais. O primeiro deles seria a criação de estruturas para o combate de incêndios florestais nas áreas indígenas. Lembro que grande parte desses incêndios são causados pelos próprios indígenas devido a prática das coivaras, tradicional técnica agrícola onde o fogo é usado para limpar os campos agrícolas. 

Outro pilar seria a correta destinação dos resíduos sólidos gerados nas aldeias. Normalmente, esses resíduos são queimados pelas populações, o que também pode iniciar grandes incêndios florestais. 

Também entrariam na conta o monitoramento das terras indígenas por meio de imagens aéreas e/ou via satélite, e também a ampliação de parcerias já existentes entre o Ministério dos Povos Indígenas e a Ambipar. 

Finalizando, a parceria também incluiria o transporte de alimentos, remédios, materiais de construção, materiais pedagógicos e educacionais, entre muitos outros. Como se nota, intenções das mais nobres e necessárias para a devida valorização e proteção dos povos indígenas. Uma iniciativa de tamanha magnitude e importância, é claro, rapidamente passou a ganhar uma grande repercussão nos noticiários e nas redes sociais. 

Parlamentares e líderes dos mais diferentes quilates e espectros políticos rapidamente passaram a se mostrar perplexos com o anúncio desse protocolo de intenções, deixando muito claro que a medida não passou por debates políticos ou públicos antes de ser assinada e anunciada. Ninguém parecia saber do que se tratava.

Entendendo o tamanho do imbrólio: as Terras Indígenas correspondem a uma área com mais de 1 milhão de km² ou 14% do território do país*. Para efeito de comparação, isso corresponde a soma dos territórios da França e da Itália. Uma concessão ou qualquer tipo de acordo entre o Governo Federal e uma empresa privada sobre esses territórios teria, obrigatoriamente, de passar pelo crivo do Parlamento brasileiro e por um profundo debate com a sociedade. 

A forte repercussão negativa gerada por esse possível acordo acendeu uma luz vermelha de alerta entre autoridades do Governo Federal. Uma forte campanha de comunicação nas redes sociais e nos noticiários passou a insistir na tecla de que tudo não passava de “mais uma fake news” contra o Governo. 

Comunicados da SECOM – Secretaria de Comunicação da Presidência da República, passaram a reafirmar que as Terras Indígenas são “territórios inalienáveis e indisponíveis”. Também insistiam que o Protocolo de Intenções teria como objetivo “fortalecer a proteção dos direitos dos indígenas” de acordo com compromissos internacionais assumidos pelo Brasil no que diz respeito aos direitos desses povos. 

Trocando em miúdos – parece que estamos assistindo a mais uma gigantesca confusão criada pela necessidade de exposição de muitas “otoridades” e da falta de conversa entre os diferentes agentes envolvidos (o famoso “faltou combinar com os russos“). As intenções, como sempre, são as melhores, mas a coisa foi conduzida da pior maneira possível. 

Consertar um estrago desse tamanho não vai ser nada fácil. Como dizem os populares: depois que se vira um pinico na frente de um ventilador, a sujeira (falando aqui da forma mais educada possível) se espalha por todos os lados… 

*Considerando que o território brasileiro tem 8,5 milhões de km², 14% corresponderia a 1,19 milhão de km². Algumas fontes afirmam que a área em questão corresponde a 1,4 milhão de km²

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