A SECA DO MILÊNIO NA AUSTRÁLIA

Seca do Milênio

Segundo alguns estudos históricos, navegadores portugueses e holandeses atingiram a costa Norte do continente australiano em diversas ocasiões a partir do início do século XVI e acabaram não demonstrando maiores interesses por aquela terra seca e inóspita – as verdejantes e úmidas ilhas indonésias e as costas do Sudeste asiático lhes pareceram mais promissoras. Foi somente no ano de 1770, que o lendário capitão James Cook, no comando do navio britânico HMS Endeavor, atingiu a costa Leste da Austrália e tomou posse das terras oficialmente em nome da Coroa Inglesa. 

O início da colonização da Austrália se deu em 1788, quando teve início a implantação de uma colônia penal na região de Botany Bay – essa colônia foi o embrião da cidade de Sidney. A partir do início do século XIX, novos contingentes de imigrantes foram chegando ao continente australiano e novas cidades passaram a ser fundadas na faixa costeira. O deserto interior australiano, o Outback, era totalmente desconhecido. No contato com os povos aborígenes, que habitavam a Austrália há dezenas de milhares de anos, esses colonizadores ouviram lendas que falavam de um grande “mar interior” com águas doces. 

As especulações sobre esse “mar interior” ganharam força em 1827, ano em que Thomas J. Maslen publicou o seu Atlas do Mundo, onde, curiosamente, foi incluído um mapa da Austrália onde aparecia esse mar, localizado nas cabeceiras dos rios Macquire e Castlereagh. Anos mais tarde, o irlandês George Fletcher Moore publicou um livro, onde reforçava a ideia da existência desse “mar” nas proximidades da cidade de Perth. Foram muitos os exploradores que se embrenharam pelos sertões australianos na busca desse lendário mar interior ( uma expedição, inclusive, levou um bote beleeiro na viagem) e a única coisa que encontraram foram as terras secas abrasadas pelo forte sol do interior australiano. 

A Austrália é continente mais seco do mundo e, na falta desse “mar interior”, os colonizadores moldaram suas cidades e vidas dentro de uma modesta disponibilidade de recursos hídricos. Com o crescimento das cidades e com as facilidades criadas pelas estações de tratamento e as redes de distribuição de água, as populações das cidades australianas acabaram se esquecendo da carência generalizada desse recurso e o consumo aumentou substancialmente. Essa “farra da água” acabou, abruptamente, a partir do ano 2000, quando uma seca forte e generalizada passou a assolar todo o país. Esse inédito evento climático, que se estendeu até o ano de 2009, foi chamada de a Seca do Milênio. De acordo com vários especialistas estrangeiros e australianos em clima, esse evento foi uma espécie de antecipação das mudanças climáticas globais na região. 

A forte intensidade da seca rapidamente foi sentida nos reservatórios de armazenamento de água das principais cidades do país – um exemplo foi o que aconteceu no reservatório Wivenhoe, o principal da cidade de Brisbane, capital do Estado de Queensland, que viu sua capacidade reduzida em poucos meses para 16%. Sem fontes alternativas para atender ao abastecimento das populações, os Governos Central e dos Estados rapidamente passaram a adotar medidas emergenciais para a redução do consumo da água. Exemplos: 

– No Sudeste do Estado de Queensland foram feitos grandes investimentos em programas de eficiência hídrica e de restrições ao uso da água. Em algumas cidades, a economia de água chegou a 60%, atingindo um nível de consumo de 125 litros diários por habitante; 

– Foram veiculadas campanhas de comunicação em massa, falando da crise hídrica e ensinando como a população poderia contribuir com a economia de água

Distribuição gratuita de kits “faça você mesmo” para a população, contendo reguladores de pressão para água e arejadores para chuveiros e torneiras

– Campanhas para a troca gratuita de até dois chuveiros, por habitação, por modelos mais eficientes;  

Troca de até dois vasos sanitários, por habitação, por modelos de baixo consumo de água: os Governos locais subsidiavam a compra dos vasos sanitários e pagava o custo de instalação por um encanador autorizado; 

Imposição de metas agressivas de redução do consumo de água para as empresas concessionárias dos serviços de saneamento básico. Os Governos vincularam o atingimento dessas metas de economia à renovação da licença de concessão e operação dessas empresas; 

– Realização de obras de infraestrutura em sistemas de distribuição, armazenamento, reuso, armazenamento de águas de chuva em cisternas entre outras

– Construção das polêmicas usinas de dessalinização, que em algumas cidades fornecem até 30% da água consumida pela população

A Austrália conseguiu “sobreviver” à Seca do Milênio e, mesmo depois de superada a crise hídrica, as principais cidades conseguiram manter o consumo de água em valores abaixo da média histórica – isso demonstra que a população mudou seu comportamento em relação ao desperdício e uso abusivo da água. Aqui no Brasil, enfrentamos situações muito parecidas em várias regiões e, infelizmente, não aprendemos muita coisa. – as crises passam e tudo volta como era dantes… 

7 Comments

  1. […] Outra forma de avaliar as diferenças drásticas nos climas dos dois países pode ser observado na disponibilidade de água: o Brasil possui 12% das reservas de água doce do mundo (lembrando que a maior parte dessa água se encontra na Bacia Amazônica), com chuvas regulares na maior parte do território. A Austrália, ao contrário, dispõe de cerca de 1% das reservas mundiais de água doce. Grande parte do território australiano sofre com a falta de chuvas, que além de irregulares, caem em volumes muito pequenos. Como se não bastassem todos esses problemas, o país enfrentou uma fortíssima estiagem generalizada entre os anos 2000 e 2009.  […]

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