O AVANÇO DO MAR NA PONTA DA PRAIA EM SANTOS

Ponta da Praia - Sérgio Furtado

A alguns dias atrás eu publiquei uma postagem falando das fortíssimas chuvas que caíram sobre a cidade de Florianópolis e em grande parte do litoral de Santa Catarina, evento climático que acabou por provocar enchentes em várias partes das cidades e que estragou o início da temporada de Verão de muita gente. Na mesma postagem, eu comentei rapidamente acerca de um outro problema que já vinha tirando o sono de muitos empresários e comerciantes catarinenses: trechos de areia de praias famosas estão desaparecendo na Ilha de Santa Catarina e o mar está avançando com força contra os calçadões e muitas construções, algumas delas irresponsavelmente construídas na faixa de domínio das praias.

Longe de ser um fenômeno isolado, o mar está avançando com força contra diferentes trechos do litoral do Brasil e de outros países. Além de Florianópolis, vou destacar a região da Ponta da Praia em Santos, litoral de São Paulo, e a Praia da Macumba, que fica bem próxima da Baía de Sepetiba, na cidade do Rio de Janeiro.

Pesquisadores científicos, como regra geral, são muito cautelosos em apresentar suas conclusões sobre problemas em que estejam trabalhando – muita gente está envolvida em pesquisas sobre a origem destes fenômenos marinhos, mas são poucos os que arriscam a falar sobre o assunto: enquanto não existirem boas provas científicas para confirmar as suas conclusões, melhor ficar calado. No caso da Ponta da Praia, já existem algumas conclusões de um estudo internacional, o que permite que falemos do assunto com um pouco mais de certeza: o litoral de Santos já está exposto a tempestades, erosão e intrusão de água salgada.

O projeto de pesquisa ao qual nos referimos foi batizado de Metrópole e está avaliando fenômenos climáticos derivados dos efeitos do aquecimento global e aferindo quais serão os seus impactos ambientais. Os estudos estão sendo feitos na cidade Broward, nos Estados Unidos, e em Selsey, na Inglaterra. A cidade de Santos foi incluída na pesquisas por possuir uma grande base de dados sobre o tema, inclusive com registros fotográficos do avanço do mar ao longo dos anos. O Projeto Metrópole é uma iniciativa internacional com a participação de pesquisadores brasileiros, norte-americanos e ingleses, que vêm desenvolvendo estudos desde 2013 sobre adaptação às mudanças climáticas em áreas costeiras, inclusive contando com apoio da FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.

Os estudos aqui no Brasil estão sendo feitos em dois setores da cidade de Santos, considerados “contrastantes” pelos pesquisadores: a Zona Noroeste, uma área de manguezais ocupada por palafitas e sujeita a inundações frequentes, que inclusive criam diversos problemas para a entrada de veículos na cidade; a outra região é Zona Sudeste da cidade, num trecho que vai do Bairro do Gonzaga até a Ponta da Praia.

De acordo com as conclusões de alguns trabalhos já finalizados, o nível médio do mar em Santos, quando comparado ao nível médio da década de 2000, deverá ficar até 18 centímetros mais alto em 2025; no ano de 2050, a elevação do nível do mar na cidade poderá chegar até 35 centímetros. Além da visível elevação do nível do mar, a região da Ponta da Praia também sofre há vários anos com fortíssimas ressacas – a faixa de areia neste trecho da orla desapareceu já a um bom tempo. A foto que ilustra este post deixa isto bem claro – uma faixa de pedras foi alinhada junto à antiga mureta da praia para reduzir a força de impacto das ondas. Ressacas recentes causaram enormes transtornos e alagamentos na região, inundando as garagens subterrâneas de vários edifícios da orla e lançando dezenas de toneladas de areia nas calçadas e vias do bairro.

Para complicar o diagnóstico das prováveis causas deste aumento do nível do mar, o canal de navegação do Porto de Santos, bem próximo da Ponta da Praia, recebeu uma série de obras de dragagem e aprofundamento nos últimos anos. Alguns pesquisadores especulam que essa dragagem pode ter alterado a força de correntes marinhas locais e produzido mudanças na dinâmica das ondas que atingem a Ponta da Praia. Pode até ser possível que uma combinação do aumento do nível do mar já observado com as obras de dragagem do Canal estejam na raiz das fortes ressacas que assolam frequentemente a região. Somente com a finalização de todos os estudos locais e mundiais, onde simulações com modelos matemáticos são processadas em supercomputadores para avaliar as possíveis alterações climáticas resultantes do aquecimento global, é que saberemos com mais certeza (certeza absoluta é muito difícil nestes casos) o que está acontecendo.

Localizada a apenas 70 km de São Paulo e com uma população na casa dos 420 mil habitantes, Santos é considerada uma das melhores grandes cidades brasileiras para se viver e um dos maiores destinos turísticos do país. Apesar de não ser muito conhecida pelos turistas de fora do Estado de São Paulo, a “provinciana” Santos recebe muito mais visitantes que muitas cidades litorâneas famosas do Nordeste. Cidades vizinhas como São Vicente e Praia Grande não ficam para trás – aliás, dados divulgados pelo Ministério do Turismo revelaram que a Praia Grande foi o 4° destino turístico de Verão mais visitado do Brasil em 2017.

Visando atenuar os problemas de erosão na Ponta da Praia, a Prefeitura de Santos iniciou no último dia 11 de janeiro os trabalhos de implantação de uma barreira com geobags de areia. A barreira terá 500 metros de extensão e 49 geobags, estruturas construídas com um tecido especial e com capacidade para armazenar 7 mil metros cúbicos de areia. Com o apoio de uma draga, mergulhadores especializados iniciaram a instalação das estacas de fixação destes geobags. Os idealizadores do projeto esperam que a barreira consiga reduzir a força das ondas no local e permita a recuperação gradual da faixa de areia.

Diante de um quadro de mudanças climáticas com consequências imprevisíveis a longo prazo, este esforço da Prefeitura de Santos pode até parecer paliativo – mas ficar de braços cruzados esperando para ver o que vai acontecer é bem pior…

Vamos continuar neste assunto no nosso próximo post.

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