A “VOLUNTÁRIA” ECONOMIA DE ÁGUA EM FORTALEZA

Castanhão

De acordo com as informações divulgadas no último dia 24 de novembro pela CAGECE – Companhia de Águas e Esgotos do Ceará, a população da Região Metropolitana de Fortaleza conseguiu reduzir o seu consumo de água em 16,75% durante o mês de outubro. Essa foi a redução de consumo média em cada ligação e foi alcançada após um alerta da CAGECE acerca de um aumento de consumo de água no mês de setembro. O consumo médio por ligação neste mês foi de 11,12 m³ – para efeito de comparação histórica, em outubro de 2014 o valor correspondia a 13,36 m³. A estratégia usada pela companhia é o oferecimento de descontos para as ligações que economizarem água – quem apresentar aumento no consumo de água, ao contrário, é penalizado com a cobrança de uma tarifa contingencial.

Até o momento, a economia de água acumulada pela população da Região Metropolitana de Fortaleza em 2017 corresponde a aproximadamente 13 milhões de m³ – durante todo o ano de 2016, o valor economizado correspondeu a 6 milhões de m³, o que demonstra que houve um aumento no esforço da população na economia de água. Há uma razão bastante objetiva para todo este esforço – os reservatórios de água do Estado do Ceará encontram-se em um nível crítico, apresentando um volume médio de 8,1% da sua capacidade máxima. O Castanhão, principal reservatório da Região Metropolitana de Fortaleza, está com um nível de apenas 3,23% de sua capacidade (vide foto). A Região é a mais populosa da Região Nordeste, com uma população superior a 4 milhões de habitantes.

Localizado oficialmente no município de Alto Santo (o reservatório se distribui por vários municípios), o Açude do Castanhão foi inaugurado em 2002 e possui capacidade para armazenar 6,7 bilhões de m³. É considerado o maior reservatório para usos múltiplos da América Latina – sua capacidade de armazenamento corresponde a 37% da capacidade total de armazenamento de todos os 8 mil reservatórios existentes no Estado do Ceará, incluindo-se na lista o Açude Orós, que durante décadas foi o maior de todos. Em sua capacidade máxima de armazenamento, o Castanhão tem condições de abastecer toda a Região Metropolitana de Fortaleza por 3 anos ininterruptamente – o problema é que desde 2012, com o início da forte estiagem que atinge toda a região do Semiárido nordestino, os volumes das chuvas na bacia hidrográfica do rio Jaguaribe têm estado abaixo da média, sendo insuficientes para recuperar os níveis do Açude.

De acordo com o DNOCS – Departamento Nacional de Obras contra as Secas, autarquia federal responsável pela operação do reservatório, o Castanhão está entrando no chamado “volume morto”, momento em que o nível do reservatório fica abaixo do nível de captação e quando passa a ser necessário o uso de outros dispositivos de captação como, por exemplo, moto bombas flutuantes. Não existe qualquer diferença na qualidade ou separação entre a água do “volume morto” em relação a água do reservatório – trata-se simplesmente da água que fica acumulada nas partes mais baixas do fundo do açude. Atingir o “volume morto” de um reservatório é simplesmente um sinal de alerta da exaustão completa dos recursos – é equivalente ao marcador de combustível de um automóvel mostrar que o tanque de combustível entrou na reserva e que é preciso parar em um posto de combustíveis para reabastecer. No caso do Castanhão, a única possibilidade de recarga dependerá da chegada das fortes chuvas de inverno (que no Nordeste corresponde ao período das chuvas), que ainda tardam em chegar.

De acordo com os cálculos da COGERH – Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará, este volume de água restante no Castanhão permite o abastecimento da população da Região Metropolitana até o mês de janeiro próximo. Esta perspectiva é extremamente preocupante pois o período das chuvas, tradicionalmente, começa em fevereiro e se estende até o mês de maio – a se confirmar os cálculos, a água do Açude se esgotará antes da chegada das chuvas.

Para preservar ao máximo o volume de água que restou no Castanhão, a companhia de águas local aumentou a captação de águas em outros reservatórios do interior do Estado, distantes até 250 km, transportadas através do chamado “Eixão das Águas” para reforçar os níveis dos reservatórios da Região Metropolitana. Essa manobra permitiu uma redução substancial da captação de águas no Açude do Castanhão – até 2016, o Açude fornecia 70% da água consumida na Região Metropolitana de Fortaleza – atualmente, a sua contribuição é de apenas 10%. O grande problema é que praticamente todo o Estado do Ceará está em situação de emergência.

Até o último mês de agosto, toda a região Norte do Estado do Ceará, incluindo a região Metropolitana de Fortaleza, era considerada como área Sem Seca Relativa – em setembro, o quadro foi alterado e a região passou a ser considerada como Área de Seca Fraca. Nas regiões Central e Sul do Estado, as áreas de seca foram agravadas, com uma redução das áreas classificadas como em Seca Moderada e com aumento das áreas de Seca Extrema e de Seca Excepcional, consideradas as mais graves da escala. Os índices médios de chuva no Estado durante o mês de setembro ficaram em 2,5 mm, absolutamente insuficientes para qualquer recuperação nos níveis dos reservatórios de água.

Um total de 137 municípios cearenses, de um total de 184 municípios do Estado, se encontram em situação de emergência por causa da estiagem decretada pelo Governo Estadual – pelo menos 17 cidades ainda aguardam o reconhecimento do estado de emergência. Esses números indicam que 74,4% do território do Estado está em situação de emergência em função da seca. O reconhecimento do estado de emergência pelos órgãos federais é de extrema importância para os municípios pois garante um atendimento prioritário na liberação de verbas e de serviços emergenciais, incluindo-se os imprescindíveis serviços de distribuição de água com caminhões pipa, foco de inúmeras tensões com os “pipeiros” do Estado, conforme relatamos em postagem anterior.

O quadro atual no Ceará faz lembrar o drama dos sertanejos na grande seca de 1915, imortalizada no livro O Quinze, de Rachel de Queiroz (1910-2003). Publicado em 1930, o livro relata as lembranças da infância da escritora, que foi uma testemunha ocular da tragédia humana que se seguiu à seca. Ao contrário do que se passava naquela época, em que migrar era a única opção para muitos, nos dias atuais existe a alternativa de se esperar a chegada de um caminhão pipa e assim amenizar um pouco a escassez de água. Não é o ideal mas, de todos os males, fiquemos com o menor.

Que não tardem as chuvas em chegar!

 

 

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