RIO CAÍ, O 8° RIO MAIS POLUÍDO DO BRASIL

Ruo Caí

Nas últimas semanas, minhas postagens têm focado os problemas causados pela poluição de importantes rios do Estado do Rio Grande do Sul – já falamos do rio dos Sinos e rio Gravataí, respectivamente, o 4° e o 5° rios mais poluídos do Brasil. São rios muito próximos geograficamente, que atravessam cidades com histórias muito parecidas e que apresentam problemas muito semelhantes. A cada postagem que escrevo, tenho ficado com a sensação de estar sendo repetitivo, tamanha a semelhança dos problemas. Hoje, infelizmente, vou precisar ser repetitivo e falar dos problemas de um terceiro rio, que junto com os rios dos Sinos e Gravataí, formam a trinca dos três rios mais poluídos do Rio Grande do Sul – vamos falar do rio Caí.

Com 250 km de extensão, o rio Caí tem nascentes no alto da Serra Gaúcha, no município de São Francisco de Paula, a 1.000 metros de altitude. Sua bacia hidrográfica tem aproximadamente 4.950 km², abrangendo total ou parcialmente 42 municípios, onde vive uma população total estimada em 490 mil pessoas. Entre estes municípios podemos destacar Gramado, Canela, Caxias do Sul e Nova Petrópolis, conhecidos nacionalmente entre os turistas de todo o Brasil que visitam o Rio Grande do Sul. Aproximadamente 400 mil pessoas são abastecidas com as águas da bacia hidrográfica do rio Caí, sendo que existem municípios que captam a água de afluentes e outros, principalmente na região do Baixo Caí, captam água diretamente da calha deste rio. A foz do rio também fica no Delta do rio Jacuí, a exemplo dos rios dos Sinos e Gravataí. O nome do rio deriva do termo em tupi antigo Ka’i e significa algo como “rio dos macacos-pregos.”

O rio Caí possui uma extensa rede de afluentes, destacando-se os arroios Cará, Cadeia, Forromeco, Mauá, Maratá e Piaí, que contribuem com muita água poluída por esgotos domésticos, industriais e resíduos sólidos, e que dão sua contribuição para colocar o rio Caí na lista dos “10 mais” do Brasil. Dos 42 municípios que fazem parte da bacia hidrográfica do rio Caí, 38 lançam esgotos domésticos sem qualquer tipo de tratamento nas águas de inúmeros pequenos cursos d’água (conhecidos como arroios na região Sul e como córregos em outras partes do país), contaminação que acaba chegando ao canal central do rio Caí. A média do tratamento de esgotos no Rio Grande do Sul é de 15%, o que está abaixo da média nacional de 42,7% – nos municípios que formam a bacia hidrográfica do rio Caí, está média é muito mais baixa, com índices inferiores a 5%.

Para entendermos claramente o problema da poluição do rio Caí, convém analisar os usos das águas ao longo do curso do rio, que é dividido em três partes distintas: Alto Caí, Médio Caí e Baixo Caí. Vejam alguns dados retirados do Relatório Qualidade das Águas da Bacia Hidrográfica do Rio Caí, publicado sob responsabilidade da FEPAM– Fundação Estadual de Proteção Ambiental.

O Alto Caí vai até a foz do Arroio Caracol, em cujo trecho estão as barragens do Salto, Blang e Divisa, destinadas a geração de energia elétrica em 4 unidades do tipo PCH -Pequena Central Hidrelétrica e acumulação de água para transposição para a bacia do rio dos Sinos. As águas destes reservatórios são de boa qualidade, usadas pelas populações para banhos e pesca artesanal, especialmente na barragem do Salto em São Francisco de Paula.

As cidades de Canela e de Gramado captam água no rio Santa Cruz; São Francisco de Paula capta água numa barragem no Arroio Querência. Dos esgotos gerados nestas cidades, apenas Gramado e Canela tratam uma parte dos seus efluentes.

O Médio Caí vai da foz do Arroio Caracol até o município de São Sebastião do Caí, onde estão as áreas mais urbanizadas e industrializadas, especialmente nos municípios de Caxias do Sul e Farroupilha, sendo o trecho mais poluído do rio. Estima-se que a carga de esgotos industriais remanescentes destes municípios que chegam até o rio Caí é de 4.650 toneladas/ano e os esgotos domésticos é da ordem de 3.730 toneladas/ano. Os esgotos domésticos e industriais são lançados sem tratamento em redes de águas pluviais e em cursos d´água que cruzam as cidades, tendo como destino final a calha do rio Caí.

Assim como ocorre com os municípios do trecho Alto, a captação de água para o abastecimento de cidades no Médio Caí também é feita em arroios e barragens. Os principais pontos de captação de água são a Represa de Galópolis em Caxias do Sul, Arroio Feitoria em Dois Irmãos e Arroios Santa Isabel e Ackermann em Nova Petrópolis. Diversas industrias realizam a captação de águas diretamente na calha do rio Caí, destacando-se uma cervejaria no município de Feliz que capta 17 mil m³/mês.

As águas do Médio Caí também têm larga aplicação na irrigação de lavouras, especialmente de hortaliças, morangos, viveiros produtores de mudas de citros e também de produção de flores. Merece destaque também a citação de atividades de mineração em municípios deste trecho do rio, principalmente argila, areia, cascalho, arenito e basalto, com destaque para a mineração de argila em Vale Real e de cascalho em Feliz. Atividades mineradores têm grande potencial para contaminação e poluição de corpos d’água.

O Baixo Caí vai do município de São Sebastião do Caí até a foz no Delta do Jacuí. Este trecho do rio é frequentemente assolado por enchentes, que atingem os municípios de Bom Princípio, Feliz, Harmonia, Montenegro, Pareci Novo, São Sebastião do Caí e Vale Real. As terras planas desta região são usadas principalmente para o plantio de arroz e para pecuária.

Uma característica marcante deste trecho é o grande número de cidades localizadas próximas ao rio Caí. Como consequência desta proximidade, as cidades captam água diretamente do leito do rio, com destaque para as cidades de Montenegro e São Sebastião do Caí, e também o Polo Petroquímico de Triunfo. Inúmeras indústrias e frigoríficos também captam águas diretamente do leito do rio Caí para uso em seus processos de produção após realizar um processo de tratamento e potabilização. O outro lado desta proximidade se reflete num maior lançamento de esgotos, especialmente domésticos, diretamente nas águas do rio Caí – nenhum município do trecho do Baixo Caí trata seus esgotos domésticos e industriais.

Merecem destaque os problemas associados aos esgotos industriais gerados pelos curtumes instalados ao longo dos Arroio Cadeia, atividade geradora de grandes volumes de poluentes químicos como os sais de cromo e resíduos de carne, gordura e pelos, que acabam lançados junto com os efluentes – tratamos longamente deste tema em postagens sobre o rio dos Sinos. Já o Polo Petroquímico de Triunfo é responsável pela geração de uma carga de esgotos industriais equivalente a 800 kg/dia. Neste trecho da bacia hidrográfica também existe mineração intensa de argila, areia e cascalho, principalmente nos municípios de Montenegro e Triunfo.

Esta rápida exposição dos usos das águas do rio Caí mostra que em toda a sua bacia hidrográfica encontramos despejos de grandes volumes de esgotos domésticos e industriais sem qualquer tipo de tratamento, atividades de mineração que geram grandes volumes de sedimentos e que acabam carreados para a calha central do rio, grandes plantações, especialmente de arroz, atividade que retira grandes volumes de água para uso em irrigação e que devolve excedentes de água contaminados com resíduos químicos de fertilizantes, herbicidas e inseticidas, entre outras agressões. Não poderia se esperar um outro resultado senão um rio altamente comprometido pela poluição, sedimentos dos mais diversos tipos e muito lixo.

Até a nossa próxima postagem, quando falaremos do rio Jacuí e do seu famoso Delta.

5 Comments

Deixe um comentário